Heranças da COVID-19 vão de doenças respiratórias a transtornos emocionais

 Cecília Emiliana 

Causa da morte de mais de 400 mil brasileiros nos últimos 12 meses – 3,17 milhões em todo o mundo – o novo coronavírus também não perdoa os sobreviventes. Depois de derrotar o micróbio, muitos deles precisam enfrentar uma segunda batalha – desta vez, contra sequelas, debilidades, doenças respiratórias e até transtornos psiquiátricos.

Estudo publicado na revista 'The Lancet' indica que 76% dos internados relatam debilidades diversas seis meses após a alta hospitalar© Cole Burston/AFP Estudo publicado na revista ‘The Lancet’ indica que 76% dos internados relatam debilidades diversas seis meses após a alta hospitalar

A “herança maldita” registrada na literatura médica já inclui dezenas de problemas de saúde – de perda de cabelo à falência renal crônica – cuja incidência impressiona. Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que uma em cada 10 pessoas infectadas pelo Sars-Cov-2 apresenta a chamada síndrome pós-COVID, ou seja: doenças e condições correlatas à virose.Leia também:A longa jornada da recuperação após a infecção pelo vírus

Ainda de acordo com a agência global, 30% dos contaminados desenvolvem a COVID longa, caracterizada pela presença de sintomas persistentes da patologia, no período de três a seis semanas após o diagnóstico.

Entre os hospitalizados, a situação é ainda mais sombria. Um estudo publicado em janeiro no periódico “The Lancet” indica que 76% dos internados relatam debilidades diversas seis meses após a alta hospitalar.

A situação já se anuncia como uma “crise dentro da crise sanitária” e preocupa autoridades de todas as esferas de governo, conforme expõe o último relatório divulgado pela Confederação Nacional dos Municípios, divulgado em 23 de abril. De acordo com o documento, secretarias de saúde de cerca de 70% das cidades do país afirmaram que implementaram ou pretendem implementar serviços de reabilitação pós-COVID nos próximos meses.

Centenas de mineiros que venceram a COVID-19, mas ainda enfrentam efeitos adversos do vírus, têm seu longo percurso de tratamento guiado pelo pneumologista e intensivista Leonardo Meira de Faria. Ele conta que atua na linha de frente da pandemia desde abril do ano passado no Hospital Felício Rocho, no Barro Preto, Região Centro-Sul de Belo Horizonte. Segundo o médico, entre os problemas mais comuns apresentados pelos pacientes – sobretudo aqueles que desenvolvem quadros graves – estão miocardites, tromboses e insuficiências respiratórias.

Leonardo Meira calcula um tempo médio de recuperação desse público em três meses, variável de acordo com o perfil de cada pessoa. Cauteloso, ele diz que evita mencionar o termo “sequela”. “Sequela indica algo definitivo. Muitos quadros são, certamente, de difícil reversão, como certos episódios de fibrose cardíaca, por exemplo.

Mas estamos falando de uma doença nova, que tem só um ano. Não sabemos ainda como ela se comporta no longo prazo, por isso é precipitado falar em sequela. Mas é fato que muitos pacientes vão conviver com limitações por um período de tempo prolongado”, ressalta o especialista.

VULNERÁVEIS O médico explica que a maioria dos problemas de saúde manifestados pelos recuperados não são causados diretamente pelo vírus, mas pelo próprio organismo – o que os cientistas chamam de “tempestade imunológica”.

Segundo o profissional de saúde, o coronavírus tem um poder de infecção muito grande. Diante disso, para nos defender, o corpo gera uma enorme resposta inflamatória, que consome toda a nossa energia, ataca nossas células, além de mobilizar todas as nossas forças para o combate à COVID-19, nos deixando vulneráveis a uma série de patógenos oportunistas. O próprio funcionamento dos órgãos pode ficar prejudicado por essa dinâmica. Os rins e o coração costumam ser os primeiros a falhar.

“A gente soma a tudo isso à própria hospitalização, que também é muito agressiva. Não é à toa que o paciente sai da UTI magro, fraco e debilitado, sem forças para levantar até mesmo os braços, precisando de fisioterapia. A internação costuma gerar uma deficiência nutricional muito grande. Imagine que o paciente que está ali lutando contra algum patógeno recebe nutrição, claro, mas o balanço é quase sempre negativo, pois os mediadores inflamatórios gerados para combater um vírus ou bactéria vão buscar energias diretamente nos músculos, pois os entendem como uma fonte mais fácil, mais disponível. Isso, literalmente, destrói a musculatura. Não há alimentação que dê conta disso”, esclarece Faria.

A fisioterapeuta Carla Eustáquio ressalta que, em alguns casos, o paciente precisa reaprender até mesmo a mastigar e deglutir. “As pessoas, às vezes, perdem movimentos de músculos que nem imaginam que tinham. Aquele das bochechas, por exemplo. Sem eles, fica difícil acomodar o alimento dentro da boca. Eis que, de repente, o paciente se vê fazendo exercícios para fortalecer esses músculos. É inusitado”, destaca a especialista, que coordena a Clínica de Saúde do UNI-BH. 

Desde o início da pandemia, o local oferece atendimento gratuito aos recuperados da COVID-19 com dificuldades motoras e problemas afins.

“A boa notícia é que, no geral, o processo de recuperação não é muito longo e as limitações costumam ser reversíveis. Em alguns casos, porém, o paciente passa por intercorrências como AVC (acidente vascular cerebral) enquanto estava internado, o que deixa a situação mais complicada. Mas, normalmente, temos muito mais desfechos felizes que infelizes”, complementa.

Turbilhão de emoções

A psicóloga Larissa Gomes compartilha da mesma perspectiva otimista quanto ao restabelecimento da saúde mental dos atingidos pelo vírus – outro grupo que, tudo indica, é significativo. Um estudo desenvolvido na Universidade de Oxford sugere que um quinto dos pacientes da COVID-19 desenvolve transtornos mentais, principalmente ansiedade e depressão.

Larissa esclarece que, principalmente os casos de internação, costumam gerar um turbilhão de novos sentimentos e emoções nas pessoas, que levam um tempo para processar a realidade.

“Incluindo a própria experiência de quase morrer. Uma coisa é saber que vamos morrer um dia, outra, é estar perto da situação. Isso gera ansiedade, preocupações, angústias, frustrações. O paciente também se vê numa condição de perda de autonomia, que também é muito impactante. De repente, um adulto de 40 anos não consegue ficar de pé, nem tomar banho sozinho. O impacto psicológico desse processo é muito grande e não poderia ser diferente”, diz a psicóloga.

“Outra coisa que as pessoas não imaginam: o paciente, na UTI, às vezes está inconsciente, mas tem momentos de consciência. Quando ele acorda, se lembra de tudo em flashs e não consegue diferenciar o que foi real e o que não foi. Isso gera confusão”, completa.

A profissional relata que, nos hospitais, o amparo psicológico do doente começa logo quando ele dá entrada, permanecem até mesmo quando ele está sedado e se estendem após a alta. Entre os problemas mais comuns manifestados pelos recuperados, Larissa enumera a síndrome do pânico – crises repentinas de ansiedade aguda, marcadas por muito medo e desespero, associadas a sintomas físicos e emocionais aterrorizantes. “Felizmente, com os devidos acompanhamentos e cuidados, as pessoas se reorganizam e seguem em frente.” 

O que é um lockdown?

Saiba como funciona essa medida extrema, as diferenças entre quarentena, distanciamento social e lockdown, e porque as medidas de restrição de circulação de pessoas adotadas no Brasil não podem ser chamadas de lockdown.https://www.youtube.com/embed/8r6LCav1Bto?autoplay=0&showinfo=1&wmode=opaque&modestbranding=1&enablejsapi=1&fs=1&rel=0&origin=https%3A%2F%2Fwww.msn.com&widgetid=2Reprodutor de vídeo de: YouTube (Política de PrivacidadeTermos)

Vacinas contra COVID-19 usadas no Brasil

Oxford/Astrazeneca

Produzida pelo grupo britânico AstraZeneca, em parceria com a Universidade de Oxford, a vacina recebeu registro definitivo para uso no Brasil pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). No país ela é produzida pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).

CoronaVac/Butantan

Em 17 de janeiro, a vacina desenvolvida pela farmacêutica chinesa Sinovac, em parceria com o Instituto Butantan no Brasil, recebeu a liberação de uso emergencial pela Anvisa.

Janssen

A Anvisa aprovou por unanimidade o uso emergencial no Brasil da vacina da Janssen, subsidiária da Johnson & Johnson, contra a COVID-19. Trata-se do único no mercado que garante a proteção em uma só dose, o que pode acelerar a imunização. A Santa Casa de Belo Horizonte participou dos testes na fase 3 da vacina da Janssen.

Pfizer

A vacina da Pfizer foi rejeitada pelo Ministério da Saúde em 2020 e ironizada pelo presidente Jair Bolsonaro, mas foi a primeira a receber autorização para uso amplo pela Anvisa, em 23/02.

Minas Gerais tem 10 vacinas em pesquisa nas universidades

Como funciona o ‘passaporte de vacinação’?

Os chamados passaportes de vacinação contra COVID-19 já estão em funcionamento em algumas regiões do mundo e em estudo em vários países. Sistema de controel tem como objetivo garantir trânsito de pessoas imunizadas e fomentar turismo e economia. Especialistas dizem que os passaportes de vacinação impõem desafios éticos e científicos.https://www.youtube.com/embed/iPy8yyTRq_4?autoplay=0&showinfo=1&wmode=opaque&modestbranding=1&enablejsapi=1&fs=1&rel=0&origin=https%3A%2F%2Fwww.msn.com&widgetid=1Reprodutor de vídeo de: YouTube (Política de PrivacidadeTermos)

Quais os sintomas do coronavírus?

Confira os principais sintomas das pessoas infectadas pela COVID-19:

  • Febre
  • Tosse
  • Falta de ar e dificuldade para respirar
  • Problemas gástricos
  • Diarreia

Em casos graves, as vítimas apresentam

  • Pneumonia
  • Síndrome respiratória aguda severa
  • Insuficiência renal

Os tipos de sintomas para COVID-19 aumentam a cada semana conforme os pesquisadores avançam na identificação do comportamento do vírus.

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Mitos e verdades sobre o vírus

Nas redes sociais, a propagação da COVID-19 espalhou também boatos sobre como o vírus Sars-CoV-2 é transmitido. E outras dúvidas foram surgindo: O álcool em gel é capaz de matar o vírus? O coronavírus é letal em um nível preocupante? Uma pessoa infectada pode contaminar várias outras? A epidemia vai matar milhares de brasileiros, pois o SUS não teria condições de atender a todos? Fizemos uma reportagem com um médico especialista em infectologia e ele explica todos os mitos e verdades sobre o coronavírus.

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Prevalência de transtornos mentais é alta, mas não teve aumento importante na pandemia

Foram avaliados 2.117 participantes do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa Brasil) em três períodos ao longo da pandemia, entre maio e dezembro de 2020, por meio de questionários de ansiedade, depressão e estresse, aplicados de forma digital e on-line – Foto: jcomp/Freepik

A pandemia de covid-19 não alterou de forma significativa a ocorrência de transtornos mentais, porém ela continua alta, afetando mais de 20% da população. O resultado faz parte de uma pesquisa realizada pela Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) que avaliou 2.117 participantes do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (Elsa Brasil), acompanhados desde 2008 e avaliados periodicamente durante a pandemia, em 2020. O trabalho também mostra que os níveis de sintomas psiquiátricos, como ansiedade e depressão, apesar de se manterem estáveis, permanecem em patamares elevados. Segundo um dos coordenadores do estudo, uma das possíveis razões para essa estabilidade, mesmo com os problemas surgidos com a pandemia, é que as pessoas amenizaram os efeitos do isolamento social por meio de conexões digitais e home office, conseguindo manter a saúde mental.+ Mais

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Os resultados são detalhados em artigo publicado em 21 de abril na revista científica Psychological Medicine, da Cambridge University Press (Reino Unido). A pesquisa avaliou a prevalência de transtorno mental e fatores de risco associados no grupo acompanhado pelo Elsa Brasil. “Ao todo, foram avaliados 2.117 participantes do Elsa Brasil em três períodos ao longo da pandemia, entre maio e dezembro de 2020, por meio de questionários de ansiedade, depressão e estresse, aplicados de forma digital e on-line”, explica o professor do Instituto de Psiquiatria (IPq) da FMUSP, André Brunoni, um dos coordenadores do trabalho. “Os dados obtidos foram comparados com avaliações feitas pelo Elsa Brasil entre os anos de 2008 e 2010, 2012 e 2016 e 2018”.

Os pesquisadores verificaram sintomas de depressão, ansiedade, fadiga, insônia, preocupações físicas e mentais, pânico, fobias, compulsões e obsessões, e alterações de apetite. “A média de idade dos participantes é de 62,3 anos, e 58,2% são mulheres”, relata o professor. “A prevalência dos transtornos mentais continuou alta, entre 20% e 25%, mas não mudou de forma significativa na comparação com valores pré-pandemia. A taxa de transtorno mental comum oscilou entre 23,5% e 21,1%, enquanto a de transtornos depressivos foi de 3,3% para 2,8%. A de transtornos de ansiedade variou entre 13,8% e 8%.”

O estudo mostra que a presença de transtorno mental foi maior em mulheres, de baixa escolaridade e com menos de 60 anos, aponta Brunoni. “Idade mais jovem, sexo feminino, nível educacional inferior, etnia não branca e transtornos psiquiátricos anteriores foram associados a aumento das chances de transtornos psiquiátricos, enquanto autoavaliação de boa saúde e boa qualidade de relações estão ligadas ao risco reduzido”, afirma. “Quanto aos sintomas psiquiátricos, inclusive os de depressão, ansiedade e estresse, apesar de uma pequena redução, os níveis permanecem elevados em relação às avaliações feitas antes da pandemia.”

Efeito teto

Para abordar as possíveis razões que levaram à estabilidade dos níveis de transtornos mentais e sintomas psiquiátricos mesmo com as dificuldades surgidas com a pandemia, o professor faz uma distinção entre as duas situações. “Sintomas e diagnósticos são coisas diferentes”, salienta. “Ter um sintoma depressivo é algo normal na pandemia, diferente de um transtorno depressivo maior, que é uma síndrome com componentes genéticos e de história de vida.”

Médico psiquiatra André Russowsky Brunoni, professor da Faculdade de Medicina (FM) da USP e coordenador da pesquisa – Foto: Arquivo pessoal

Brunoni observa que possivelmente os patamares de transtornos e sintomas já estavam tão altos que não permitiram uma elevação maior. “Por exemplo, antes da pandemia, quase um em cada quatro participantes do Elsa Brasil tinha um transtorno mental comum. Não havia mais espaço para aumentar, o que é chamado de ‘efeito teto’”, explica. “Outra explicação possível para o resultado é que as pessoas conseguiram manter a saúde mental ao evitar o isolamento, através de conexões digitais e home-office.”

“O próximo passo do estudo é identificarmos quem são as pessoas mais vulneráveis a apresentarem ou piorarem o transtorno mental comum, continuando esta avaliação ao longo de 2021”, planeja Brunoni.

Por meio da investigação de um grupo de 15 mil funcionários de seis instituições públicas de ensino superior e pesquisa do Nordeste, Sudeste e Sul do Brasil, o Elsa Brasil pesquisa a incidência e os fatores de risco para doenças crônicas, principalmente cardiovasculares e diabetes, sendo que entre os fatores indiretos estão as doenças relacionadas à saúde mental.+ Mais

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Os resultados da pesquisa são apresentados no artigo Prevalence and risk factors of psychiatric symptoms and diagnoses before and during the COVID-19 pandemic: findings from the Elsa-Brasil Covid-19 Mental Health Cohort, publicado em 21 de abril no site da revista científica Psychological Medicine, da Cambridge University Press (Reino Unido). O estudo foi liderado por André Brunoni, Isabela Bensenor e Paulo Lotufo, da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP). O trabalho teve a colaboração de pesquisadores da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), Harvard Medical School (Estados Unidos) e Oxford University (Reino Unido) e foi apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).

Mais informações: e-mail brunowsky@gmail.com, com o professor André Brunoni


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O aumento de problemas de saúde mental no trabalho com a pandemia

Segundo estudo recente realizado pela American Psychological Association (APA), as grandes empresas têm oferecido auxílio no que se refere à saúde mental por conta da pressão que a pandemia tem exercido sobre os colaboradores.

A psicóloga, Maria Cristina Munhoz Moreira, explica que as mudanças nas rotinas das empresas geraram maiores desafios e consequentemente novas pressões a gestores e colaboradores, sendo assim, problemas como a ansiedade e depressão aumentaram diante desse cenário.

A especialista traz algumas orientações para um maior bem-estar e para a prevenção de problemas de saúde mental no trabalho.

“Para conseguir buscar um equilíbrio nesse momento desafiador, o ideal é ter momentos no dia para respirar de forma mais tranquila, praticar alguma meditação, realizar atividades físicas com regularidade e, se estiver de home office, não esquecer de limitar os horários de serviço e momentos de descanso.”

Identificando o momento de procurar ajuda

Nesse cenário de pandemia que tem durado mais tempo do que se esperava, muitas pessoas relatam sensações em comum, sendo assim, como saber se é o momento de procurar por auxílio especializado?https://b0761754de535ee5dd024a5cfb15d90a.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

“Se torna necessária a procura por ajuda a partir do momento em que sintomas como: ansiedade intensa, preocupações recorrentes, alterações do sono, tristeza, angústia e desânimo, começam a tomar a maior parte do dia, persistindo por mais de uma semana atrapalhando a rotina habitual da pessoa. Isso chama a atenção para buscar auxílio psicológico e caso na terapia seja evidenciada a necessidade de medicação, seria indicado o acompanhamento em conjunto com o psiquiatra”, orienta a especialista.PUBLICIDADE

Lidando com a ansiedade

Segundo dados do Ministério da Saúde, entre 23 de abril e 15 de maio foi realizado um estudo por meio de questionário, que mostrou que a proporção de ansiedade relatada pelos participantes era de 86,5%.

Embora considere complexo orientar o controle da ansiedade, já que se apresenta em cada pessoa de maneira distinta, a psicóloga acredita que um dos caminhos para lidar com o problema é compreender que não há um controle sobre o que é externo, não está nas próprias mãos a solução do problema.

“Neste momento o ideal é não consumir demasiadamente as informações sobre a pandemia e se dedicar a momentos de lazer, meditação e atividade física, pois isso muda os pensamentos e libera hormônios do prazer”, acrescenta.

Trabalho remoto e o impacto sobre gestores e equipes

Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Depressão, suicidio / Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O aumento de problemas de saúde mental no trabalho também se deve à mudança para uma rotina home office.https://b0761754de535ee5dd024a5cfb15d90a.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Muitas pessoas passaram a se sentir ainda mais sobrecarregadas de trabalho em casa, por não conseguirem estabelecer limites entre vida pessoal e profissional.

A psicóloga acredita que é preciso analisar os pontos positivos e negativos dessa realidade. Para ela, dentre os pontos negativos do trabalho remoto, está a falta de socialização com os colegas de trabalho, como nas pausas para o café, por exemplo.

“O trabalho remoto gera em muitas pessoas a sensação de maior tempo de trabalho e poucos momentos de relaxamento”, acrescenta.

A especialista também pontua os benefícios desse modelo, como, principalmente, a flexibilização de horário, dando a muitas pessoas a possibilidade de dormirem até um pouco mais tarde, por não precisarem sair de casa e a possibilidade de maior convívio com a família.

“Para um equilíbrio, é importante ter bem definidos os horários de trabalho, com períodos de descanso e o momento de se desligar. O ideal é ter um ambiente em casa apenas para as atividades profissionais, que gere a sensação de entrada e saída da jornada de trabalho. Essa é uma atitude que parece pequena, mas faz toda a diferença. Nós seres humanos temos associados à nossa condição a capacidade de adaptação às novas situações, sempre criando formas mais leves de encarar o dia a dia”, conclui.

Por: Maria Cristina Munhoz Moreira, atua em consultório em parceria com o psiquiatra Dr. Daniel Munhoz Moreira.

Pandemia pode ter criado um novo transtorno de ansiedade, a coronafobia

Expressão surgiu pela primeira vez em artigo médico, publicado em dezembro de 2020, mas o psicólogo João Paulo Machado de Sousa sugere cautela para a ideia de um novo diagnóstico

“Coronafobia” é o transtorno de ansiedade ligado ao pânico ocasionado pelo medo da covid-19 – Arte de Lívia Magalhães com imagens de Pixabay

A pandemia da covid-19 forçou o mundo a descobrir e adotar como rotina o “novo normal”. E, não dá para negar as evidências, a transformação rápida do modo de vida, somada ao pânico da contaminação pelo vírus sars-cov-2 e das mortes provocadas pela doença, vem trazendo consequências. Como efeito colateral, muitas pessoas estão desenvolvendo transtornos de saúde mental. Para se ter uma ideia, nos meses de abril e maio de 2020, oito entre dez brasileiros já sofriam de algum transtorno de ansiedade; eram os primeiros meses da pandemia, quando houve o aumento das mortes pelo novo coronavírus.

Os dados foram revelados por uma pesquisa feita na época pelo Ministério da Saúde com 17,5 mil brasileiros entre 18 e 92 anos de idade. Mas são confirmados por estudos em todo o mundo e registrados na literatura médica como uma fobia específica do coronavírus. O transtorno foi descrito pela primeira vez em dezembro do ano passado, num estudo publicado pelo Asian Journal of Psychiatry e batizado como coronafobia.

João Paulo Machado de Sousa – Foto: Fapesp/Reprodução

Segundo o especialista em saúde mental da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) da USP, o psicólogo João Paulo Machado de Sousa, é esperado um aumento dos transtornos de ansiedade em época de pandemia, já que o medo de contágio fica mais acentuado. Mas, adianta o psicólogo, ainda não se tem um diagnóstico formal da coronafobia que, por ser muito recente, não consta das classificações diagnósticas utilizadas pelos médicos profissionais da área. Classificações estas importantes para as trocas de informações e tratamentos das doenças. “Um diagnóstico de transtorno mental tem uma utilidade grande e específica, que é permitir que os profissionais conversem sobre um mesmo fenômeno que tem um nome e que agrupa vários sintomas, várias apresentações”, afirma Sousa.

Cauteloso quanto ao surgimento de um novo transtorno de saúde mental, o psicólogo lembra que existem outras questões a serem analisadas, como a criação de protocolos para lidar com o novo transtorno, a verificação dos estágios de avaliação do paciente e a implementação do melhor tratamento. Questões ainda não respondidas, tendo em vista que o próprio diagnóstico da covid-19 é recente e ainda passa por mudanças. Para Sousa, os artigos médicos têm falado de um transtorno do estresse relacionado à covid-19, mas “é preciso perguntar se precisamos de uma categoria nova. Temos várias outras categorias diagnósticas, como síndrome de burnout, por exemplo, que talvez deem conta do fenômeno que está sendo chamado de coronafobia”.

Coronafobia: sintomas e prevenção

A coronafobia é um transtorno de ansiedade e, como tal, é caracterizado por medo excessivo, persistente e irreal de situações, pessoas, objetos. Como todo transtorno de ansiedade, a coronafobia é um problema de saúde mental que requer atenção médica e psicológica. “Toda fobia tem sintomas físicos, cognitivos e comportamentais. Como sintomas físicos existem as palpitações, os aumentos do batimento cardíaco, aumento da sudorese, que é o suor excessivo, agitação psicomotora e perturbação ou privação do sono”, afirma Sousa. Tem também a sensação de falta de ar, que é um dos principais sintomas da covid-19.

Os primeiros sinais de que alguma coisa está errada são quando a pessoa apresenta as mesmas preocupações com o coronavírus que todo mundo apresenta, mas de forma exagerada e, principalmente, quando a preocupação causa prejuízos, afetando relacionamentos, atividades profissionais – quando o medo do contágio atrapalha o rendimento no trabalho – e até a integridade física, com algum risco médico. “Nós tivemos muitas pessoas que se intoxicaram no início da pandemia porque ingeriram vários produtos de limpeza, como os derivados de cloro”, relata o psicólogo. 

Sousa afirma ainda que, em termos cognitivos, há ruminações contínuas ou pensamentos obsessivos do tipo “eu vou morrer”, “vou me contaminar”, “vou contaminar minha família” ou “o mundo inteiro nunca mais vai sair dessa pandemia”. Como comportamento mais saudável, Sousa indica que se deve evitar locais públicos, meios de transportes compartilhados e a necessidade de reassegurar constantemente a ausência da doença através de testes contínuos.

Para a prevenção dos riscos da pandemia aos transtornos mentais, Sousa acredita que devemos ficar alertas “quando as medidas usadas para prevenção acabam trazendo problemas para o indivíduo e quem está à sua volta. Exigências de cuidado que acabam criando conflitos. O limite entre prevenção e fobia é cruzado quando os comportamentos começam a ficar excessivos e causam prejuízos”.


Jornal da USP no Ar 
Jornal da USP no Ar é uma parceria da Rádio USP com a Escola Politécnica, a Faculdade de Medicina e o Instituto de Estudos Avançados. No ar, pela Rede USP de Rádio, de segunda a sexta-feira: 1ª edição das 7h30 às 9h, com apresentação de Roxane Ré, e demais edições às 10h45, 14h, 15h e às 16h45. Em Ribeirão Preto, a edição regional vai ao ar das 12 às 12h30, com apresentação de Mel Vieira e Ferraz Junior. Você pode sintonizar a Rádio USP em São Paulo FM 93.7, em Ribeirão Preto FM 107.9, pela internet em www.jornal.usp.br ou pelo aplicativo do Jornal da USP no celular. 


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Tatiana Pimenta: como cuidar da saúde mental e evitar a Síndrome de Burnout?

Tatiana Pimenta: como cuidar da saúde mental e evitar a Síndrome de Burnout?

Por Tatiana Pimenta04/05/2021 – 16:46

Burnout estresse
O estresse crônico no ambiente de trabalho é uma questão muito séria (Imagem: Pixabay/Sammy-Williams)

A síndrome de burnout é uma condição caracterizada pelo esgotamento mental, psicológico e físico de profissionais. Esta exaustão extrema foi classificada como enfermidade pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e, a partir de 2022, estará inclusa na nova Classificação Internacional de Doenças (CID-11).

Em outras palavras, o estresse crônico no ambiente de trabalho é uma questão muito séria e deve ser tratada com cautela pelos gestores. A Associação Internacional de Manejo do Estresse (ISMA) apontou que somente no Brasil cerca de 72% dos profissionais possuem alguma sequela oriunda do estresse.

Ambientes de trabalho desagradáveis, ferramentas de trabalho obsoletas, alta competitividade, longos expedientes, ausência de feedback, comunicação interna ineficiente, desrespeito com a vida particular dos trabalhadores, falta de espírito de equipe e tarefas tediosas são alguns dos elementos que corroboram para o burnout de profissionais.PUBLICIDADE

Negro Negra Mercado de trabalho
Ambientes de trabalho desagradáveis, alta competitividade, longos expedientes são motivos para s síndrome (Imagem: Unsplash/@heylagostechie)

Como se pode ver, nem todos tem ligação direta com à função desempenhada na organização ou à qualidade das relações interpessoais. Processos internos ineficazes, a desorganização dos gestores e a postura imprópria de superiores também causam impacto negativo na saúde mental dos trabalhadores.

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Sendo assim, o que é necessário para cuidar da saúde mental dos profissionais?https://1451897bb451c0f1fee283bffbf71205.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Primeiramente, um olhar minucioso para os mínimos detalhes dos processos organizacionais e aspectos normalmente ignorados da cultura organizacional.

Quando os trabalhadores de uma organização caem na rotina, eles se acostumam com os elementos desgastantes do ambiente de trabalho. Isso não significa, contudo, que não sentem desconforto. Eles somente aprendem a ignorá-lo para dar continuidade à rotina.

Em algum momento da vida profissional desses trabalhadores, o acúmulo de estresse e a insatisfação se tornarão insustentáveis. A síndrome de burnout normalmente acompanha outras condições de saúde, como depressão, ansiedade generalizada, pressão alta, gastrite, enxaqueca e até disfunções sexuais.

Essas doenças não prejudicam somente a qualidade de vida dos colaboradores, mas também afetam negativamente a imagem das empresas e o trabalho desenvolvido. Afinal, quem gostaria de trabalhar em um ambiente que deixa as pessoas doentes?

Burnout estresse
Essas doenças não prejudicam somente a qualidade de vida dos colaboradores (Imagem: Pixabay/silviarita)

Além disso, não são todos os profissionais que esperam o esgotamento chegar. Muitos deixam a organização antes disso, elevando o índice de turnover e dificultando o processo de estruturação de equipes.

Por isso, os gestores devem estar atentos para os pequenos pontos disfuncionais presentes nas relações interpessoais, na comunicação interna, na delegação de tarefas e todos os aspectos que compõem o fluxo de trabalho da organização.

1.     Identificar pontos fracos

Gestores devem passar um pente fino no organograma e nos processos internos da empresa para identificar pontos fragilizados. Para ajudar a coletar informações, podem desenvolver questionários sobre a qualidade do trabalho e fazer reuniões com os departamentos.

Em seguida, podem transferir todos os dados para um documento e deixá-lo sempre atualizado. A partir das suas descobertas, os gestores conseguem identificar o que precisa ser modificado, o que pode ser mantido e o que pode causar problemas no futuro. Essas informações facilitam a elaboração de estratégias para evitar a síndrome de burnout.

2.     Encorajar o cuidado com a saúde mental

Ainda são poucas as pessoas que reconhecem a importância de cuidar da saúde mental. A maioria começa a fazer terapia somente quando não aguenta mais conviver com o estresse, depressão e ansiedade. A cultura de prevenção de transtornos mentais ainda é escassa.

Assim, encoraje os trabalhadores a cuidarem de si mesmos.

“Encoraje os trabalhadores a cuidarem de si mesmos”, diz Tatiana Pimenta (Imagem: Divulgação)

Elabore produtos de comunicação interna com informações relevantes sobre o assunto, leve psicólogos para palestrar na empresa, faça reuniões ou encoraje a realização de reuniões dentro dos departamentos para dar espaço para os trabalhadores se expressarem sobre o trabalho, incentive a leitura de conteúdos enriquecedores sobre saúde mental e considere contratar um psicólogo organizacional.

Deste modo, os profissionais, aos poucos, passarão a olhar para si mesmos e compreender a importância de aliviar o estresse do dia a dia.

3.     Modificar a cultura organizacionalhttps://1451897bb451c0f1fee283bffbf71205.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

É claro que os gestores não devem esperar que os trabalhadores ajam por conta própria. A cultura organizacional como um todo deve mudar para corresponder às novas visões dos colaboradores sobre saúde mental.

Caso contrário, não adianta incentivá-los a cuidarem de si mesmos para barrá-los com ideias contrárias, censuras ou processos que dificultam a satisfação de suas necessidades.

Uma cultura organizacional que valoriza a saúde mental é composta por acessibilidade, comunicação eficiente e livre de ruídos, feedback, reconhecimento de feitos, respeito mútuo, compreensão das necessidades dos trabalhadores, programas de mentoria e valores que promovem a união. Para alcançar este cenário, os gestores também devem estar dispostos a mudar.

Mulher Empresa Trabalho
Uma cultura organizacional que valoriza a saúde mental é composta por acessibilidade, comunicação eficiente e livre de ruídos (Imagem: Pixbabay/089photoshootings)

4.     Estreitar laços entre departamentos

A qualidade dos relacionamentos interpessoais também merece ser avaliada. Se o convívio social for desagradável, os trabalhadores terão dificuldade para encontrar razões para se tornarem membros valiosos da empresa. Eles podem simplesmente encontrar um ambiente profissional mais agradável.https://1451897bb451c0f1fee283bffbf71205.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

As relações sociais nas empresas são complexas. Diversos sentimentos estão presentes – arrogância, hesitação, insegurança e soberba. Eles incentivam múltiplos comportamentos e nem sempre eles são adequados. Um trabalhador arrogante, por exemplo, desestrutura a equipe inteira com a sua postura.

Assim, os gestores devem interferir ligeiramente para fazer as mediações necessárias, tais como conversar com os trabalhadores com conflitos evidentes, promover eventos para incentivar o estreitamento de laços e fazer reuniões de equipe.

Trabalho Jovens Negros
Os gestores devem interferir ligeiramente para fazer as mediações necessárias (Imagem: Pixabay)

5.     Focar na satisfação dos trabalhadores

Profissionais satisfeitos não veem problema em deixar as suas residências todos os dias para trabalhar e interagir com colegas. Por outro lado, profissionais insatisfeitos buscam outras oportunidades de trabalho, ficam doentes e não trabalham com cuidado, elevando a possibilidade de erros e crises.

Cabe aos gestores entender o que causa a insatisfação dos colaboradores e usar esse conhecimento para tornar o ambiente profissional agradável para todos. Por exemplo, um profissional pode acreditar que está desperdiçando o seu potencial na empresa e, assim, ficar entediado e procurar outro trabalho. O que se pode fazer para deixá-lo satisfeito?https://1451897bb451c0f1fee283bffbf71205.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

É claro que, em alguns casos, não é possível satisfazer os profissionais por completo. O perfil de determinado trabalhador pode não ser compatível com a empresa ou o trabalho. Mesmo que soluções sejam pensadas, ele pode não gostar de nenhuma. Por essa razão é importante selecionar bem os candidatos para o trabalho.

Criminosos cobram resgate para não divulgar dados de pacientes de saúde mental

Uma brecha de segurança em uma das maiores clínicas de saúde mental da Finlândia levou a milhares de pacientes sendo extorquidos pelos criminosos no segundo semestre de 2020. O caso envolveu a Vastaamo, rede de clínicas com dezenas de unidades espalhadas pelo país europeu, que viu as informações pessoais e, no mais grave, também de tratamento, vazando quando os bandidos obtiveram acesso aos bancos de dados da empresa por um período de quase seis meses, entre novembro de 2018 e março de 2019.

Apesar das datas, todo o histórico dos pacientes que passaram pela instituição desde 2008, quando ela foi fundada, estaria disponível no banco de dados, que não contava com as devidas proteções de segurança e tinha senhas de acesso inseguras. A própria Vastaamo chegou a ser extorquida, com os bandidos exigindo um valor de 40 Bitcoins, à época equivalente a cerca de US$ 520 mil.

Quando a rede não efetuou o pagamento, os criminosos se voltaram aos pacientes, além de prometerem vazar 100 registros médicos por dia até que o resgate fosse pago. Entre as primeiras exposições estavam figuras públicas, políticos e até celebridades que buscaram tratamento na Vastraamo, mostrando que os criminosos haviam analisado as informações que possuíam e estavam prontos para a guerra.

Os bandidos tinham acesso ao histórico médico dos pacientes e até mesmo às anotações de psiquiatras e médicos, incluindo relatos feitos de forma confidencial durante sessões de terapia, que revelavam segredos e detalhes sobre relacionamentos afetivos ou familiares. Os dados serviam, basicamente, como uma devassa sobre a intimidade de cerca de 30 mil pessoas, que eram extorquidos em € 200, ou cerca de R$ 1.300, que deveriam ser pagos em 24 horas. Caso contrário, o total aumentava para € 500, cerca de R$ 3.200, a serem pagos em dois dias — por fim, as informações seriam não apenas publicadas na internet, mas também enviadas, justamente, às pessoas citadas pelos indivíduos em seus relatos.

Vista de uma das unidades da Vastaamo, que foi epicentro de um dos mais graves vazamentos de dados da história da Finlândia. Segurança inadequada levou às exposição de dados de tratamento e extorsões contra pacientes psiquiátricos (Imagem: Divulgação/Vastaamo)

A revista americana Wired explorou algumas destas histórias pessoais, como a do estudante Jere, que passou pela Vastaamo durante sua adolescência para lidar com questões relacionadas ao abuso de drogas, álcool e as relações complexas com sua mãe. O ataque, como aponta o relato dele, foi feito de forma direcionada, já que ele e também seus familiares receberam a mesma oferta de extorsão, caso contrário, todos os segredos de seu tratamento — incluindo relatos de abuso, confissões e anotações sobre seu estado mental à época — seriam abertos aos envolvidos e ao público.

Histórico de problemas

Após investigação, as autoridades finlandesas concluíram que a Vastaamo foi responsável pelo incidente, por não possuir práticas adequadas de segurança digital. Os históricos dos pacientes, por exemplo, não estavam criptografados, enquanto terminais e sistemas de acesso remoto compartilhavam senhas fáceis de serem descobertas. Não era como, entretanto, se esse fosse a primeira ocasião em que comportamentos irregulares eram identificados.

Entre as denúncias já realizadas contra a rede estavam o uso de anúncios no Google, direcionados a pacientes de instituições rivais, e o uso de aplicativos e compartilhamento de dados pelos usuários de forma a acelerar os atendimentos iniciais. Ville Tapio, o fundador da Vastaamo ao lado de seus pais e CEO à época do incidente, nunca negou sua abordagem voltada ao aspecto de negócios por trás das unidades, mas aponta que a instituição sempre trabalhou pelo bem-estar social.

A reportagem da Wired também aponta sérios problemas técnicos nas soluções usadas pela cadeia, com sistemas desenvolvidos internamente e de forma acelerada para acompanhar o ritmo de crescimento da empresa. O foco, novamente, estava na facilidade de uso, mas com ela, também vieram os problemas de segurança e até mesmo o descumprimento de legislações relacionadas à privacidade e ao tratamento de dados hospitalares que levaram ao vazamento em massa das informações.

Apesar dos problemas, a Vastaamo não interrompeu os atendimentos durante o incidente, enquanto entrava em contato com os pacientes atingidos oferecendo informações e aconselhamento gratuito. O caso, hoje, é assunto de projetos de lei que tornam ainda mais pesadas as multas e sanções para casos de violação de privacidade e vazamento de dados devido à imprudência das companhias, enquanto investigações federais ainda estão em andamento para localizar o responsável, ou o grupo, por trás do vazamento.

Para as vítimas, resta apenas o temor enquanto o banco de dados completo da rede de clínicas permanece circulando pela internet, em fóruns de cibercrime e sistemas de compartilhamento. Não se sabe, também, quantas pagaram o resgate solicitado pelos bandidos e o total de pessoas que foram atacadas diretamente por eles.

Empresas vão lidar com saúde mental dos funcionários depois da pandemia

Mulher, computador, estresse
(energic.com/Pexels)

De sextas-feiras informais a drinques depois do trabalho, os rituais semanais estão voltando, à medida que os americanos retornam ao escritório. E embora máscaras e salas de conferência vazias alterem o cenário, os empregadores, no entanto, estão empenhados em fazer as coisas voltarem ao normal – ou pelo menos o mais normal possível.

Mas isso não será fácil. Os danos da Covid-19 poderão ser sentidos no local de trabalho muito depois de a doença ter diminuído. Isso é graças ao peso mental e emocional que a pandemia cobrou de funcionários que, como todo mundo, passaram o último ano vivendo com medo, isolamento e tristeza.

“Estamos vendo números bastante alarmantes”, disse Vaile Wright, diretora sênior de inovação em saúde da American Psychological Association (APA), que supervisiona a pesquisa “Estresse na América“. Dados da APA mostram extensos esforços cognitivos e comportamentais não saudáveis — incluindo sono interrompido, aumento do consumo de álcool e baixa atividade física. Além disso, cerca de 61% dos adultos relatam ganho ou perda de peso indesejado.PUBLICIDADE

Geralmente, a APA e outros especialistas encorajam alimentação saudável, sono e exercícios, com abundantes conexões sociais, tudo isso combinado para construir uma “base sólida” que permite que as pessoas suportem a pressão diária – como a encontrada no escritório. Essa base normalmente depende de rotinas: hora de dormir e acordar consistentes, exercícios regulares e horários das refeições.

“Estamos ouvindo, tanto a partir dos dados quanto de forma anedótica, que as pessoas simplesmente não são capazes de fazer essas coisas”, disse Wright.

E não é apenas no escritório onde esse mal-estar está se manifestando. De acordo com o professor Lawrence Katz, economista da Universidade de Harvard, isso está acontecendo nas salas de aula, com os alunos de graduação.

“Eles querem o básico – você sabe, o tipo de curso genérico onde você apenas faz os exames e não tem que fazer nada extra”, disse Katz. Os seminários para jovens, que normalmente apresentam projetos mais expansivos, viram as inscrições cair pela metade, disse ele. “Eles parecem estar menos dispostos a fazer coisas desafiadoras.”

Para os funcionários, essa dinâmica pode se traduzir em menor capacidade de trabalho do que em tempos pré-pandemia – tornando a abordagem disso um imperativo econômico para as empresas.

Cathleen Swody, psicóloga organizacional da consultoria Thrive Leadership, disse que os chefes precisam estar cientes de que muitos funcionários estão – pela primeira vez na vida – enfrentando um surto de excessos, ansiedade, depressão ou até mesmo uso de substâncias.PUBLICIDADE

“Saiba que isso vai variar de pessoa para pessoa, dependendo de suas circunstâncias pessoais e experiências de pandemia”, disse ela. “Alguns estarão ansiosos para voltar ao escritório, e outros terão muita resistência porque simplesmente não estão preparados para isso.”

Wright, Swody e Dowling concordam que, conforme os trabalhadores voltam, os empregadores devem facilitar o acesso aos recursos de bem-estar. As empresas devem subsidiar aulas de ginástica online, associações a academias e programas de saúde mental. Isso inclui gerenciamento de estresse, terapeutas e programas de assistência ao funcionário. Novas estratégias exclusivas para a pandemia podem incluir chats de vídeo ao ar livre e “caminhadas e conversas” com profissionais de saúde mental.

No entanto, essas ofertas podem não ser utilizadas se os gerentes não explicitamente normalizarem seu uso durante a jornada de trabalho. Isso, dizem os especialistas, é uma consideração crítica para os funcionários cujas manhãs e noites são ocupadas com obrigações, como cuidar dos idosos ou das crianças.

Mary-Alice Vuicic é diretora de pessoal da empresa de informações de negócios Thomson Reuters. Ela disse que sua empresa expandiu seus recursos de saúde mental e bem-estar. “Queremos tornar o acesso mais fácil para as pessoas em todo o mundo, muitas das quais podem vir por meio da telessaúde e da variedade de provedores”, disse ela.

Uma opção pronta para os empregadores que buscam facilitar o retorno dos funcionários ao escritório é garantir que eles tirem todas as férias que acumularam. Presos em casa sem nenhum lugar para ir e nada para fazer, americanos que foram sortudos o suficiente para permanecer empregados em 2020, invariavelmente, acumularam muitos dias.

“Muitas empresas vão se encontrar em uma situação muito estranha, com problemas gigantescos de acumulação de férias”, disse Dowling. A Bloomberg LP, controladora da Bloomberg News, concorre com a Reuters no fornecimento de notícias e serviços financeiros.

Saúde mental: RH se preocupa, mas investimento não chega

Na pequisa da Kenoby, 67% dos RHs disseram que a empresa já teve afastamento de funcionários por problemas emocionais

Estresse no trabalho

Saúde mental no trabalho: 53,4% dos RHs não sabiam dizer se a empresa pretende investir em saúde mental (Klaus Vedfelt/Getty Images)https://a63d45a821e12db7ef7cb2147bb77c92.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html

Para 93% dos RHs, empresas ainda ignoram questão da saúde mental. Esse é um dos dados da pesquisa da Kenoby, startup de tecnologia para recursos humanos, sobre os impactos da saúde mental no trabalho.PUBLICIDADE

A Exame Academy reuniu um time de especialistas para te ensinar a usar melhor o seu tempo e ganhar em produtividade e qualidade de vida.

O questionário feito com 488 profissionais de recursos humanos de todo o Brasil, em sua maior parte de empresas com até 500 funcionários, mostrou que o problema está presente entre as preocupações e prioridades do RH. Mas ainda é difícil ter um plano de ação concreto – e o investimento – para solucionar o problema.

Entre os entrevistados, 53,4% não sabiam dizer se a empresa pretende investir em saúde mental. Outros 35% responderam que o investimento virá em menos de um ano.

“Ficou bem claro na pesquisa, o RH está consciente do problema que a gente tem, mas a empresa ainda não está preparada para investir no assunto. Vemos que muitos apontam o problema, mas falta investimento. Voltamos ao ponto de que as questões de RH precisam ser mais estratégicas”, comenta Felipe Sobral, diretor de Marketing da Kenoby.

De acordo com 71% dos entrevistados, ainda não existe uma área ou pessoa dedicada para tratar sobre o tema. Mas quase 60% disseram que está nos planos da empresa contratar um profissional ou criar um departamento dedicado a saúde mental dos colaboradores.

A criação de uma diretoria dedicada na Ambev foi destaque no ano passado. Mariana Holanda, a primeira diretora de Saúde Mental da Ambev desde junho, falou a EXAME sobre como o sonho grande da cervejaria está mudando e passa pela criação de um ambiente mais tolerante ao erro e seguro psicologicamente.

E são diversos motivos que impulsionam o tema dentro das empresas. A segurança psicológica foi apontada por uma pesquisa do Google como o fator número um para garantir a alta performance de equipe, além de propiciar um ambiente mais criativo e inovador.

Depois, os cuidados com o bem-estar diminuem a rotatividade de talentos e o absenteísmo, fatores que diminuem a produtividade individual e coletiva. De acordo com a pesquisadora Sara Evans-Lacko, da London School of Economics, o Brasil perde 78 bilhões de dólares com a queda de produtividade causada pela depressão.